sábado, 27 de julho de 2013

Irmandade - Capítulo 4

Dois dias. O tempo que transcorreu desde que minha vida mudou completamente. Em um dos raros momentos de lucidez que tinha lembrei-me de minha irmã mais nova. Ela estava escondida no porão de uma casa abandonada. Assim como nossos pais haviam ordenado. Corri para casa. Precisava saber se ela estava bem.
- Tina! Estava tão preocupada com você! - ela me abraçou. Ouvi sua pulsação. Agradeci por ter encontrado um andarilho no meio da rua e tomado seu sangue. Antes ele do que minha pequena irmã.
- Catrina, querida, tive problemas, mas eu estou bem. Senti sua falta! E adivinha? - levantei a mão. Havia roubado uma pequena mercearia. Já que estava no fundo do poço, não havia porque ser honesta. Meus pais haviam deixado eu e minha irmã sob responsabilidade de meu irmão. Mas ele havia sido tirado de casa para lutar ao lado dos alemães. Obvio que eles não sabiam que meu irmão era judeu. E agora era meu dever cuidar dela - Comida para você.
Ela pegou o saco com um enorme sorriso no rosto. Fiquei feliz por ela estar feliz. Enquanto ela comia um pão, troquei de roupa rapidamente.
- Você não vai comer?
- Já comi. - respondi rapidamente. Não havia conseguido comer nada, só queria o líquido quente, viscoso e escarlate. Sentei-me em um pequeno sofá, logo ela se sentou ao meu lado e encostou sua cabeça em meu ombro.
- Como está lá fora?                                                 
- Ruas escuras, pessoas passando fome, pessoas cobrando absurdos por um pão e ouvi falar que os soldados estão vindo para a cidade.
- E nossos pais? Alguma notícia? - a resposta era sim, mas resolvi ficar calada. Às vezes era melhor ficar na ignorância do que descobrir a verdade.
- Nenhuma querida... - observei que seus olhos brilharam, estava prestes a chorar - Mas, ouvi falar que alguns soldados vão ter permissão para visitar a família. - ela me olhou, um sorriso enorme surgiu em seu rosto. Preferi não lhe contar que talvez nosso irmão não viesse junto.
Acabamos pegando no sono. Acordei com um barulho ritmado e irritante. Olhei para Catrina, "via" o sangue pulsando dentro de suas veias. A sede e a fome eram enormes. Levantei-me rapidamente.
- O que houve? - ela parecia assustada.
- Tenho que ir. Prometo que voltarei!
Meu coração se apertou quando essa lembrança invadiu minha mente. A afastei rapidamente de minha cabeça, não podia ser fraca. Aquilo havia ocorrido há muito tempo. Tempo demais. Não deveria me afetar.
- Você tem duas escolhas... Posso ajudá-lo, mas a decisão será sua.
- E quais são essas escolhas? -
- Primeira, dizer que você está morto. Segunda opção, envolver ela nessa loucura.
- Não se importam se humanos souberem da existência de vocês?
- Você quis dizer da nossa existência - ele deu de ombros - Caso a pessoa saiba guardar segredos e conviver com isso... Quantos anos ela tem?
- 28.
- 28... ela deve estar casada..
- Sim, e está grávida de gêmeos.
- Gêmeos! Pobre mulher... Você a envolveria nessa confusão? Sangue, predadores, etc. - ele abriu a boca para responder - Não precisa responder agora. Pode pensar, depois conversaremos sobre isso. – dirigi um pouco e logo estacionei na garagem de um hospital. Pelo elevador fui até a recepção. John havia ficado no carro, disse que ele devia ficar pensando, mas temia pela vida dos pacientes na sala de espera do consultório.
- Olá, boa tarde. Preciso falar com a Diana. - delicadamente empurrei uma nota de cem para a garota - É urgente. - ela pegou a nota e discou para um número.
- Siga no corredor, a última porta é a dela. - sorri delicadamente.
- Valentina! Voltou rápido, deve fazer uma semana que veio aqui. - ela apertou minha mão. Vampiros evitavam se aproximar demais de humanos. Diana era uma médica que nós "alimentava". Ela vendia sangue.
- Tive uma visita inesperada. Preciso de um pouco mais, não muito, porque vou tirar férias em dois dias. - ela fez um gesto afirmativo com a cabeça e ficou em pé. Seguimos por um corredor e entramos em uma sala refrigerada. Ela pegou quinze sacos de sangue e colocou em uma bolsa térmica. Fiz um cheque com uma alta quantia para que ela repusesse o que havia sido retirado. - Obrigada. Nós vemos por aí.
- De nada. É obvio que nós vemos. - ela sorriu desdenhosa. Pensei em respondê-la, mas preferi ficar de boca fechada, não valia à pena. Peguei a bolsa térmica e saí. John ainda estava no carro, ele estava procurando uma estação de rádio.
- Esta estação que você ouve é meio ruim.
- Eu escuto CDs. - me debrucei levemente sobre ele para abrir o porta-luvas, peguei o porta CDs e lhe entreguei. Ele observou os discos enquanto voltava para a rua movimentava. Escolheu um de rock clássico.
- Para onde vamos agora? - observei o relógio. 17:00.
- Meu apartamento. Um amigo vai nos visitar. - um silêncio se formou, passamos por um grupo de jovens, os olhos de John brilharam de desejo. Aumentei a velocidade do carro. Ele desviou o olhar e me fitou.
-  Antes de tomar minha decisão em relação a minha irmã, quero saber sobre os tais perigos...
Estava na rua da casa que minha irmã estava escondida. Fazia dois dias que havia ido visita-lá. Ouvi uma porta se abrir. Escondi-me em um beco. Três homens saiam da casa. Meu coração disparou. Rezei para que eles não tivessem feito nenhum mal a minha irmã. Eles passaram por mim. Todos usavam roupas pretas. Um deles olhou para o beco. Parecia ser bem jovem. Tinha olhos violetas. Ameaçadores. Aqueles olhos se gravaram em minha mente. Quando eles sumiram na esquina corri para casa. A porta estava arrombada.
- Catrina?! Cadê você?! - desci as escadas até o porão, onde era para ela estar. A encontrei encolhida em um canto escuro. O cheiro doce invadiu meu olfato. Controlei minha sede. Havia enormes cortes por todo corpo dela. Faltavam duas unhas.
- Tina... - sua voz soou tão baixa e dolorida, que me deu vontade de chorar.
- Shii.. - coloquei meu dedo em seus lábios. Havia sangue neles. A peguei no colo. Delicadamente a deitei no sofá.
- Eles estavam te procurando... por favor se proteja...
- Querida, não diga nada... guarde suas forças... eu vou chamar um médico... - ela não me deixou terminar.
- Eles disseram que você era uma aberração... que havia se tornado uma vampira... que iam te matar! - ela observou meus olhos verdes sendo tomados pelo prata, depois meus lábios onde as presas tocavam meu lábio inferior - Eu não me importo. Você ainda é minha irmã, minha protetora - ela respirou profundamente e soltou um gemido por entre os dentes - Só me prometa que vai ficar viva.
- Desculpe Cat... eu devia estar aqui... devia ter te protegido! - um pequena lágrima rolou em meu rosto.
- Tina... - ela engasgou, um pouco de sangue saiu por sua boca - Você não teve culpa... só me prometa...
- Eu te prometo querida. - ela sorriu e depois começou a tossir desesperadamente, vomitando sangue. Apertei sua mão. Rezei para um Deus que a cada dia duvida mais que existia. De repente ela parou. Sua respiração e pulsação diminuíram até se tornarem inexistentes - Catrina...
Aquelas lembranças eram dolorosas demais. E fiquei agradecida por ter voltado à realidade.
- Lembra-se de que eu disse que existem 3 lados ruins? - ele balançou a cabeça - O primeiro lado e ter que viver de sangue, apesar de que com a idade você consiga comer, mas o sangue sempre vai ser o seu alimento principal. O segundo é que você provavelmente vai ver todos seus familiares morrer. E por último a pior parte, os caçadores.

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